A Responsabilidade Governamental e seus Limites

Robert S. Barker

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Robert S. Barker Nos Estados Unidos, como em qualquer democracia, a garantia mais importante da responsabilidade governamental ?o direito dos cidad¡¦s controlarem seu governo atrav¡¦ de eleições. Mas as eleições n¡¦ s¡¦ a ¡¦ica forma de assegurar a responsabilidade das autoridades p¡¦licas. Robert S. Barker, professor de Legislação da Faculdade de Direito da Universidade de Duquesne, com amplos pronunciamentos sobre o assunto, discute os principais componentes da responsabilidade neste artigo sobre o sistema norte-americano.


O ideal da liberdade republicana parece exigir... n¡¦ apenas que todo o poder emane do povo, mas que aqueles que o recebem sejam mantidos na depend¡¦cia do povo.

-- James Madison, The Federalist, No. 37


... a concentração de poder e a submiss¡¦ dos indiv¡¦uos aumentar?entre as nações democr¡¦icas... na mesma proporção da sua ignor¡¦cia.

-- Alexis de Tocqueville, Democracy in America, Parte II, Livro IV


A responsabilidade governamental (ou seja, o dever das autoridades p¡¦licas em relatar suas ações aos cidad¡¦s e o direito dos cidad¡¦s iniciarem ações contra as autoridades cuja conduta seja considerada insatisfat¡¦ia) ?um elemento fundamental, talvez o elemento essencial da democracia. O prop¡¦ito deste artigo ?analisar alguns aspectos da responsabilidade governamental conforme refletem as constituições, leis, hist¡¦ia e tradições pol¡¦icas dos Estados Unidos.

A Constituição dos Estados Unidos

A Constituição dos Estados Unidos cont¡¦ diversas disposições que abordam diretamente a responsabilidade governamental. O Artigo I, Seção 5, exige que cada casa do Congresso "mantenha um di¡¦io dos seus trabalhos e o publique periodicamente, omitindo as partes que possam, a seu crit¡¦io, exigir confidencialidade; e os votos contr¡¦ios e a favor dos membros de cada casa sobre qualquer quest¡¦ dever¡¦, mediante a vontade de um quinto dos presentes, ser inclu¡¦os no di¡¦io". Do presidente, exige-se que, "periodicamente", forne¡¦ ao Congresso "informações sobre o Estado da Uni¡¦" e, sempre que vetar qualquer projeto de lei aprovado pelo Congresso, ele ?obrigado a declarar suas objeções e tais objeções devem ser publicadas no di¡¦io da Casa congressual de onde originou-se o projeto de lei.

A Constituição tamb¡¦ exige que "um Balan¡¦ regular dos Gastos e Receitas de todo o dinheiro p¡¦lico... seja divulgado periodicamente". A Sexta Emenda estabelece que o acusado em uma ação criminal "dever?ter direito a... um julgamento p¡¦lico". ?importante ressaltar que todos os funcion¡¦ios civis dos Estados Unidos s¡¦ sujeitos a demiss¡¦ do cargo por m?conduta, mediante impedimento pela C¡¦ara dos Deputados e condenação pelo Senado. Por fim, a Constituição garante a responsabilidade atrav¡¦ da imposição de mandatos fixos para aqueles que exercerem o poder legislativo e executivo federal. Todas essas garantias promovem a responsabilidade, ao exigirem que o governo apresente suas atividades e fornecendo meios ordin¡¦ios e extraordin¡¦ios de demiss¡¦ de funcion¡¦ios p¡¦licos. As constituições dos 50 Estados cont¡¦ diversas disposições similares ¡¦ encontradas na Constituição nacional.

Estatutos e Decretos

Al¡¦ das garantias constitucionais mencionadas acima, existem muitos estatutos federais e estaduais, al¡¦ de decretos locais, que promovem diretamente a responsabilidade, garantindo aos cidad¡¦s, por exemplo, o direito de inspecionar registros p¡¦licos, exigindo que as autoridades p¡¦licas revelem suas fontes de renda, que os candidatos a cargos p¡¦licos apresentem os nomes daqueles que contribuem para as suas campanhas e que as reuni¡¦s legislativas sejam abertas ao p¡¦lico (o termo "estatuto" designa uma lei aprovada pelo Congresso dos Estados Unidos ou pelo legislativo de qualquer dos Estados; o termo "decreto" refere-se a uma lei aprovada por uma cidade, condado ou outro governo local). Estas e outras disposições promovem a responsabilidade de forma direta e ¡¦via. Tais disposições, naturalmente, s¡¦ importantes; s¡¦ entretanto igualmente importantes as garantias indiretas de responsabilidade que fluem da estrutura do governo norte-americano e da hist¡¦ia da pol¡¦ica norte-americana.

Governo Local

H?alguns anos, um rep¡¦ter de jornal perguntou ao prefeito de uma grande cidade norte-americana: "O que ?mais importante: a pol¡¦ica nacional ou a pol¡¦ica local?" O prefeito, citando Thomas P. "Tip" O'Neill, falecido porta-voz da C¡¦ara dos Deputados, imediatamente respondeu: "Toda pol¡¦ica ?local!" Ele estava certo e sua resposta identificou uma das caracter¡¦ticas da tradição pol¡¦ica norte-americana que promove a responsabilidade governamental. Desde os tempos coloniais, a base da participação dos cidad¡¦s no governo tem sido o governo local. Em todos os locais das treze col¡¦ias originais, os colonizadores se organizaram em vilas e municipalidades que, por sua vez, agruparam-se em condados. Quando os colonos estabeleceram seus legislativos coloniais, seguiram de forma geral a pr¡¦ica de ter cada vila, municipalidade ou condado elegendo um representante para a casa inferior do legislativo daquela col¡¦ia.

O direito a voto naqueles tempos era, na maior parte das vezes, severamente restringido; n¡¦ era permitido que escravos, mulheres e os que n¡¦ possu¡¦m terra votassem. Muitas quest¡¦s importantes eram decididas pela Coroa em vez dos colonos, mas os sistemas coloniais de governo local e representação legislativa estabeleceram as bases para a responsabilidade permanente: as autoridades locais eram conhecidas e dependentes dos seus vizinhos e, portanto, a responsabilidade era natural. A pr¡¦ica de eleição de legisladores por distritos com membros ¡¦icos significava que cada legislador era escolhido por uma comunidade definida, com quem se identificava e ?qual era respons¡¦el, garantindo novamente um alto grau de responsabilidade.

Embora cada Estado determine por si pr¡¦rio, atrav¡¦ da sua pr¡¦ria constituição ou leis, a extens¡¦ exata do poder governamental exercido pelos seus governos locais, o papel do governo local sempre foi muito importante em todas as partes, tanto pol¡¦ica como legalmente.

A Separação dos Poderes

Quando as col¡¦ias se declararam independentes, os novos Estados Unidos da Am¡¦ica mantiveram as bases de governo local estabelecidas durante a era colonial e constru¡¦am sobre elas um sistema de separações verticais e horizontais de poderes que continuasse a garantir a responsabilidade governamental. Neste particular, as palavras de Thomas Jefferson em um estudo anterior sobre o Estado de Virg¡¦ia, s¡¦ t¡¦ descritivas quanto prof¡¦icas:

A concentração [de todos os poderes de governo] nas mesmas m¡¦s ?exatamente a definição de governo desp¡¦ico... O governo pelo qual lutamos era um que tivesse bases n¡¦ apenas nos princ¡¦ios de liberdade, mas no qual os poderes de governo fossem assim divididos e equilibrados entre diversos corpos de magistratura... que ningu¡¦ pudesse transcender seus limites legais sem que fosse efetivamente julgado e restringido pelos demais... Por esta raz¡¦... os poderes legislativo, executivo e judici¡¦io dever¡¦ ser separados e distintos, de forma que nenhuma pessoa possa exercer os poderes de mais de um deles ao mesmo tempo.

Em uma carta a um contempor¡¦eo, Samuel Kercheval, Jefferson afirmou posteriormente:

Devemos... dispor nosso governo na forma de (1) uma rep¡¦lica federal geral, para tudo o que se referir a temas federais e externos; (2) do Estado, para tudo o que se referir exclusivamente aos nossos cidad¡¦s; (3) as rep¡¦licas dos condados, para os deveres e preocupações do condado; e (4) as rep¡¦licas dos distritos, para as pequenas mas numerosas e interessantes preocupações da vizinhan¡¦. Assim, no governo, bem como em qualquer outro assunto da vida, ?somente atrav¡¦ da divis¡¦ e subdivis¡¦ de tarefas que todos os assuntos, grandes e pequenos, podem ser administrados at?a perfeição.

A "separação de poderes" descrita por Jefferson possui pelo menos tr¡¦ dimens¡¦s: primeiramente, a alocação de poder governamental ente ramos separados de governo (ou seja, "separação de poderes no sentido estrito"); em segundo lugar, a divis¡¦ desse poder de tal forma que a autoridade de um dos ramos em um dado assunto seja limitada pela autoridade de outro ramo sobre o mesmo assunto ou um tema relacionado (este processo ?normalmente denominado "controle m¡¦uo"; trata-se essencialmente de um sistema de responsabilidade intra-governamental). O terceiro aspecto desta disposição ?a divis¡¦ vertical do poder governamental, de tal forma que cada tarefa governamental seja atribu¡¦a ?menor e mais local unidade de governo capaz de realiz?la. Este ?o princ¡¦io da subsidiariedade que, naturalmente, engloba o federalismo.

Todos esses aspectos de separação de poderes encontram-se refletidos na Constituição dos Estados Unidos, escrita na Filad¡¦fia em 1787. A Constituição fornece ao governo federal (ou "nacional") certos poderes, tais como o poder de conduzir relações externas, decidir quest¡¦s de guerra e paz e regulamentar o com¡¦cio entre os Estados e com pa¡¦es estrangeiros. Esses poderes enumerados e todos os poderes ali impl¡¦itos podem ser exercidos pelo governo federal. Todos os poderes n¡¦ delegados ao governo federal pela Constituição s¡¦, segundo as palavras da pr¡¦ria Constituição, "reservados respectivamente aos Estados ou ao povo". Esta divis¡¦ de poderes, tornada expl¡¦ita pela D¡¦ima Emenda ?Constituição, estabelece o princ¡¦io do federalismo.

O poder governamental federal ?dividido entre tr¡¦ ramos, o legislativo, executivo e judici¡¦io, que assim estabelecem a "separação de poderes" no sentido estrito. Al¡¦ disso, o exerc¡¦io de poder por qualquer dos tr¡¦ ramos do governo federal ?limitado de v¡¦ias formas pelos poderes concedidos aos demais ramos, estabelecendo, assim, o princ¡¦io de controle m¡¦uo.

Esta abordagem de separação de poderes tamb¡¦ foi conduzida em cada Estado na sua pr¡¦ria constituição estadual, atrav¡¦ da divis¡¦ de poder entre tr¡¦ ramos no governo estadual; a criação de diversos controles m¡¦uos entre os tr¡¦ ramos de governo; e a alocação de muitos poderes governamentais a dois n¡¦eis inferiores de governo local, condados e municipalidades.

Um dos resultados dessas divis¡¦s de poder ?que, no meu pr¡¦rio Estado, a Pensilv¡¦ia, e na maior parte dos demais, todos os anos s¡¦ eleitorais; ou seja, a cada ano, alguns cargos municipais, de condados, estaduais ou federais s¡¦ preenchidos atrav¡¦ de eleições. Isso significa que o cidad¡¦ tem a oportunidade de ir ¡¦ urnas duas vezes por ano; primeiro, s¡¦ as eleições prim¡¦ias, para escolher os candidatos do seu partido; e, posteriormente, a eleição geral, para escolher dentre os candidatos dos diversos partidos.

De forma pr¡¦ica, isso significa que o governo est?sujeito a escrut¡¦io constante e que, portanto, ?objeto de um processo constante de responsabilidade (a melhor fonte isolada de informações sobre governos estaduais ?o Livro dos Estados, publicado anualmente pelo Conselho de Governos Estaduais, em Lexington, Kentucky).

Revis¡¦ judicial

De forma muito importante, a responsabilidade governamental ?exercida e obrigada pelos tribunais, atrav¡¦ do processo conhecido como "revis¡¦ judicial", que se inicia com a decis¡¦ hist¡¦ica da Suprema Corte dos Estados Unidos em 1803, na ação Marbury vs. Madison. Naquela ação, o presidente John Adams, nos ¡¦timos dias do seu mandato, nomeou William Marbury como juiz de paz no Distrito de Col¡¦bia. Entretanto, a "nomeação" de Marbury (ou seja, o documento certificando sua nomeação) n¡¦ lhe foi entregue e o mandato presidencial de Adams terminou. O novo presidente, Thomas Jefferson, ordenou que a nomeação n¡¦ fosse entregue.

Marbury entrou ent¡¦ com ação na Suprema Corte dos Estados Unidos, em busca de uma ordem que obrigasse o secret¡¦io de Estado, James Madison, a entregar-lhe a nomeação. Marbury argumentou que um estatuto federal concedia ?Suprema Corte o poder de exercer a jurisdição original em ações como a dele. A Suprema Corte concluiu, entretanto, que a Constituição limita sua jurisdição original a certas categorias de ações, e que a ação de Marbury n¡¦ se enquadrava em nenhuma dessas categorias. Assim, a Corte afirmou que havia um conflito entre o estatuto federal, que pretendia conferir jurisdição original, e a Constituição, que pretendia negar a jurisdição original.

Como, prosseguiu a Corte, a Constituição ?a "lei suprema do pa¡¦", a Constituição deve prevalecer sobre qualquer outra lei, federal ou estadual, que entre em conflito com ela. Conseq¡¦ntemente, a Corte aplicou a Constituição, ignorando o estatuto, e negou a reivindicação de Marbury por falta de jurisdição.

A ação Marbury vs. Madison estabeleceu o princ¡¦io de que todas as leis e outras ações governamentais devem estar de acordo com a Constituição e que qualquer indiv¡¦uo que acredite que seus direitos constitucionais estejam sendo violados por qualquer n¡¦el de governo (federal, estadual ou local) pode obter reparação atrav¡¦ de litigação apropriada. Assim, a cada ano, as cortes federais e estaduais dos Estados Unidos decidem centenas de ações em que as autoridades governamentais s¡¦ chamadas para defender a constitucionalidade dos seus atos.

Tr¡¦ decis¡¦s famosas da Suprema Corte ilustram como esse processo de revis¡¦ judicial funciona como instrumento de responsabilidade:

Em 1952, durante a Guerra da Cor¡¦a, o sindicato dos metal¡¦gicos anunciou sua intenção de ir ?greve contra os principais fabricantes de a¡¦ dos Estados Unidos. Poucas horas antes da greve come¡¦r, o presidente Harry Truman emitiu um decreto do executivo que colocava as ind¡¦trias de a¡¦ sob controle do governo federal, a fim de mant?los trabalhando. As companhias de a¡¦ imediatamente apresentaram ação contra o governo federal, argumentando que o presidente havia excedido seus poderes com base na Constituição. Na sua decis¡¦ (Youngstown Sheet & Tube Co. vs. Sawyer), a Suprema Corte, por seis votos contra tr¡¦, concluiu que o presidente de fato havia excedido seus poderes constitucionais. O governo devolveu imediatamente as f¡¦ricas de a¡¦ aos seus donos, de acordo com a decis¡¦ da Corte.

Talvez o exerc¡¦io mais famoso de revis¡¦ judicial nas ¡¦timas d¡¦adas tenha sido a decis¡¦ da Suprema Corte na ação de 1954 entre Brown vs. Conselho de Educação, em que a Corte sustentou que as leis que estabeleciam a segregação racial nas escolas p¡¦licas violavam a garantia constitucional de "igual proteção das leis". A decis¡¦ Brown e diversas outras decis¡¦s de "igual proteção" que se seguiram estabeleceram o princ¡¦io de que o governo ?respons¡¦el para com todas as pessoas, n¡¦ apenas ¡¦ que constituem a "maioria" em um dado momento.

Em 1974, a Suprema Corte enfrentou uma ação de grande import¡¦cia constitucional, como conseqüência do esc¡¦dalo de Watergate. Dois anos antes, a sede do Comit?Nacional Democr¡¦ico, localizada em um complexo de edif¡¦ios conhecido como "Watergate", havia sido assaltada. Logo ficou claro que o assalto havia sido organizado por pessoas pr¡¦imas ao presidente Richard Nixon e que, ap¡¦ o assalto, diversos conselheiros do presidente, e provavelmente o pr¡¦rio Nixon, haviam conspirado para impedir as investigações do crime. Diversos ex-membros da equipe do presidente foram acusados de crimes relacionados ao assalto de Watergate e seu "encobrimento". Durante seu julgamento, a corte criminal federal ordenou que o presidente entregasse ?corte certas fitas de conversas presidenciais que foram alegadamente relevantes para o caso. O presidente recusou-se, argumentando que ele tinha o direito de preservar a confidencialidade das comunicações presidenciais.

A Suprema Corte, atrav¡¦ de voto un¡¦ime no caso Estados Unidos vs. Nixon, decidiu contra o presidente e ordenou que ele entregasse as fitas ?corte criminal. A Corte argumentou que, embora o presidente de fato tenha "privil¡¦ios executivos", que lhe permitem manter a confidencialidade de conversações presidenciais, esse privil¡¦io n¡¦ ?absoluto, mas sim deve ser analisado em cada caso em consideração com o interesse compensat¡¦io pela divulgação. A Corte concluiu que, como o presidente Nixon n¡¦ havia declarado nenhuma necessidade espec¡¦ica de confidencialidade, seus interesses foram superados pela ¡¦via necessidade de manter a integridade do processo criminal. O presidente entregou imediatamente as fitas ?corte criminal.

Liberdade de Express¡¦

As regras, pr¡¦icas e decis¡¦s anteriores, assegurando a responsabilidade governamental, teriam sido e agora seriam ineficientes, se n¡¦ fosse por outro conjunto de princ¡¦ios profundamente enraizados na hist¡¦ia e na legislação norte-americana: liberdade de express¡¦, imprensa, reuni¡¦, petição e associação, que s¡¦ garantidas pela Primeira Emenda ?Constituição e s¡¦ freq¡¦ntemente denominadas coletivamente "liberdade de express¡¦". Os detalhes dessas liberdades da Primeira Emenda encontram-se al¡¦ do escopo deste breve artigo. Entretanto, um caso em particular serve para demonstrar a forte conex¡¦ entre liberdade de express¡¦ e responsabilidade governamental.

No in¡¦io dos anos 1960, o jornal The New York Times publicou um an¡¦cio pol¡¦ico que fazia certas acusações de m?conduta sobre uma autoridade municipal no Estado do Alabama. A autoridade processou o The New York Times por difamação. No julgamento, estabeleceu-se que as acusações eram falsas e a corte ordenou que o Times pagasse danos ?autoridade difamada. Na apelação, a Suprema Corte dos Estados Unidos reverteu a decis¡¦, sustentando que o direito de criticar o governo ?t¡¦ importante que mesmo acusações falsas sobre autoridades p¡¦licas s¡¦ protegidas pela Constituição.

A Corte concluiu, portanto, que uma autoridade p¡¦lica pode recuperar danos por difamação somente quando o anunciante (seja ele um indiv¡¦uo ou um jornal) saiba que a declaração difamat¡¦ia ?falsa, ou age com precipitada desconsideração pela verdade. Esta decis¡¦, New York Times vs. Sullivan, estabeleceu o princ¡¦io de que a liberdade de express¡¦ ?mais altamente protegida ao criticar-se o governo e as autoridades do governo e, de forma contr¡¦ia, que as autoridades p¡¦licas possuem muito pouca proteção contra as cr¡¦icas, mesmo que a cr¡¦ica seja baseada em erro.

A menos que os cidad¡¦s possam falar abertamente, publicar e debater suas id¡¦as, e organizar-se em grupos de acordo com seus pr¡¦rios crit¡¦ios e princ¡¦ios, eles n¡¦ podem possibilitar que as autoridades sejam chamadas ?responsabilidade. Felizmente, os Estados Unidos possuem longa tradição de respeito por essas liberdades.

Os Limites da Responsabilidade

A responsabilidade tem seus limites. Como reconheceu a Suprema Corte no caso Watergate, o interesse do governo, por exemplo, na proteção da seguran¡¦ nacional ou na manutenção da confidencialidade das comunicações diplom¡¦icas poder? em qualquer dada situação, superar as raz¡¦s da revelação. A pr¡¦ria Constituição, ao exigir que o Senado e a C¡¦ara dos Deputados mantenham e publiquem registros dos seus procedimentos, concede expressa exceção ¡¦ "Partes que possam, a seu crit¡¦io, exigir confidencialidade".

Al¡¦ disso, as cortes decidiram que a obrigação constitucional do governo federal em publicar um "relat¡¦io de receitas e despesas" n¡¦ exige a publicação de informações que comprometam a seguran¡¦ nacional, enquanto a garantia constitucional de um julgamento p¡¦lico pode ser limitada em casos extremos, caso tal limitação seja necess¡¦ia para assegurar que o acusado receba um julgamento adequado.

Nos Estados Unidos, como em qualquer democracia, a garantia mais importante de responsabilidade governamental ?o direito dos cidad¡¦s controlarem o rumo da pol¡¦ica governamental e a identidade dos que exer¡¦m o poder governamental, atrav¡¦ do processo eleitoral. Todas as outras disposições constitucionais e estatut¡¦ias s¡¦ apenas medidas auxiliares. O governo respons¡¦el depende, em ¡¦tima inst¡¦cia, de cidad¡¦s respons¡¦eis ou, mais precisamente, de eleitores respons¡¦eis, que levem a s¡¦io os assuntos p¡¦licos, informem-se sobre as quest¡¦s e os candidatos, debatam vigorosamente, votem regularmente e possuam o sentido moral de distinção entre o certo e o errado. As exig¡¦cias de relatos e revelações e as leis sobre reuni¡¦s abertas t¡¦ seu lugar, mas carecem de significado para cidad¡¦s complacentes, c¡¦icos ou auto-tolerantes. A responsabilidade, como a liberdade, exige eterna vigil¡¦cia.

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