A DIPLOMACIA NORTE-AMERICANA N・ NECESSITA
SILENCIAR-SE SOBRE ARMAS DE PEQUENO PORTE

Rachel Stohl, Analista S・ior, Centro de Informa苺es de Defesa,
e Presidente, Grupo de Trabalho Norte-Americano
sobre Armas de Pequeno Porte (SAWG)

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photo of Rachel Stohl "A difus・ e o mau uso das armas de pequeno porte causam, prolongam e exacerbam as crises humanit・ias em todo o mundo. Nos ・timos anos, emergiu crescente consenso internacional de que necessitam ser tomadas medidas para evitar uma avalanche mundial de armas de pequeno porte", afirma Rachel Stohl, analista s・ior do Centro de Informa苺es de Defesa e presidente do Grupo de Trabalho Norte-Americano sobre Armas de Pequeno Porte. Ela incentiva o governo a "tentar 'multilateralizar' as melhores pr・icas e desenvolver normas e padr・s para combater a prolifera艫o e o mau uso das armas de pequeno porte".

As armas de pequeno porte s・ uma classe de armamentos respons・el pela maior parte das ocorr・cias atuais de conflito e, estima-se, por 500 mil mortes e milhares de outros ferimentos anualmente. A difus・ e o mau uso das armas de pequeno porte causam, prolongam e exacerbam as crises humanit・ias em todo o mundo. Nos ・timos anos, emergiu crescente consenso internacional de que necessitam ser tomadas medidas para evitar uma avalanche mundial de armas de pequeno porte. Esses armamentos s・ muitas vezes comercializados de forma ilegal atrav・ dos mesmos canais obscuros utilizados pelos cart・s da droga, terroristas e crime organizado. Os governos internacionais reconheceram a import・cia de refrear esse com・cio.

Uma confer・cia das Na苺es Unidas sobre a quest・ das armas de pequeno porte em julho de 2001, destinada a concentrar-se na coordena艫o das a苺es internacionais para lidar com o com・cio il・ito de armas de pequeno porte e armamentos leves, tornou-se o primeiro esfor・ internacional sobre aquilo que foi at?agora, em grande parte, miss・ com bases nacionais e regionais. A Confer・cia das Na苺es Unidas sobre o Com・cio Il・ito de Armas de Pequeno Porte e Armamentos Leves em Todos os Seus Aspectos enfatiza o esfor・ para refrear o com・cio internacional de armas de pequeno porte e talvez reduzir a escalada do n・ero de mortos por ele causados.

As organiza苺es n・-governamentais (ONGs) est・ cada vez mais frustradas ?medida que os governos perdem de vista seu objetivo intr・sico: o de eliminar o sofrimento humano causado pelo com・cio il・ito de armas de pequeno porte. A quest・ das armas de pequeno porte, na confer・cia das Na苺es Unidas e al・ dela, exige lideran・ e a苺es nacionais, regionais e internacionais coordenadas para eliminar o impacto devastador dos armamentos, que incluem a coopera艫o e a coordena艫o entre os governos e as ONGs. Os governos devem tentar "multilateralizar" as melhores pr・icas e desenvolver normas e padr・s para combater a prolifera艫o e o mau uso das armas de pequeno porte.

A lideran・ norte-americana sobre quest・s de armas de pequeno porte ?agora mais vital do que nunca. Na esfera pol・ica norte-americana, entretanto, o tr・ico de armas de pequeno porte n・ tem tido alta prioridade. Muitas vezes, os elaboradores pol・icos detestam envolver-se na quest・ da prolifera艫o de armas de pequeno porte por consider?la uma tentativa de introdu艫o de controle de armas dom・ticas, ou por acharem que a quest・ ?por demais controversa. Outros acreditam que existem outras quest・s mais importantes para serem tratadas.

A preocupa艫o das ONGs e ativistas ?que o sil・cio sobre a prolifera艫o il・ita de armas de pequeno porte poder?significar que a quest・ receba pouca ou nenhuma aten艫o das principais autoridades pol・icas em futuro pr・imo e n・ receber?posi艫o mais alta na agenda pol・ica. A in・cia norte-americana sobre o tr・ico de armas de pequeno porte seria um erro tr・ico, n・ apenas para os milh・s de pessoas afetadas pelas armas de pequeno porte em todo o mundo, mas tamb・ para a credibilidade e posi艫o dos Estados Unidos entre seus aliados, que seria prejudicada por n・ tentar inibir esse flagelo. As armas de pequeno porte tornaram-se amea・ genu・a aos interesses de seguran・ nacional dos Estados Unidos, pois sua prolifera艫o perpetua os conflitos violentos e cria novos ciclos de viol・cia e crime. Al・ disso, a prolifera艫o descontrolada de armas de pequeno porte coloca em risco as tropas e os mantenedores da paz dos Estados Unidos quando armamentos em excesso desestabilizam regi・s de conflito, ou quando os esconderijos de armas n・ s・ removidos de situa苺es p・-conflito. As armas de pequeno porte tamb・ reduzem as oportunidades comerciais dos Estados Unidos e elevam custos, reduzindo a capacidade de organiza苺es humanit・ias e assistenciais conduzirem seus esfor・s e enfraquecendo as possibilidades de desenvolvimento sustent・el.

Para combater os perigos da prolifera艫o de armas de pequeno porte, ?necess・io desenvolver pol・icas sobre vendas legais, em conjunto com a coopera艫o internacional para reduzir o tr・ico il・ito. Um aspecto n・ pode ser tratado sem o outro, pois a fronteira entre o com・cio legal e o il・ito ?muitas vezes incerta ou deliberadamente turva. Muitos armamentos ilegais em circula艫o foram, em algum momento, legalmente transferidos por governos ou com aprova艫o governamental. O crescente uso e depend・cia de traficantes privados internacionais tamb・ desnorteia a quest・ (em alguns casos, estas s・ vendas legais e, em outros, n・ s・). As vendas governamentais legais em seu pr・rio direito garantem a aten艫o internacional, por poderem tamb・ gerar abusos de direitos humanos, contribuir para o prolongamento de conflitos ou ser utilizadas para prop・itos indesejados.

As op苺es pol・icas sobre armas de pequeno porte s・ abundantes e podem ser implementadas a custo relativamente baixo, atingindo resultados grandes e tang・eis. O governo Clinton apresentou diversas medidas para controlar a prolifera艫o de armas de pequeno porte que n・ foram implementadas. V・ias delas dever・ ser adotadas pelo governo Bush para demonstrar o forte compromisso norte-americano com a quest・ das armas de pequeno porte.

Primeiramente, os Estados Unidos dever・ liderar a morat・ia de vendas de armas para todas as regi・s em conflito (especialmente conflitos cont・uos) e trabalhar com outros Estados para a ado艫o de morat・ia similar. Em muitos pa・es e regi・s, existem em circula艫o armas de pequeno porte suficientes para armar os piores conflitos do mundo por v・ias vezes. Novos estoques n・ necessitam entrar na cadeia de fornecimento.

Em segundo lugar, um crit・io descrito no C・igo de Conduta da Uni・ Europ・a e no Documento sobre Armas de Pequeno Porte da Organiza艫o para a Seguran・ e Coopera艫o na Europa dever?ser rigorosamente aplicado ・ exporta苺es internacionais de armas de pequeno porte. Os crit・ios, tanto da Uni・ Europ・a como da Organiza艫o para a Seguran・ e Coopera艫o na Europa, enfatizam a obriga艫o do Estado exportador de evitar vendas de armas que contribuam para as viola苺es dos direitos humanos e outros atos de repress・, exacerbem tens・s regionais, provoquem ou prolonguem conflitos, apresentem alto risco de desvio para o mercado il・ito ou ameacem de outra forma a paz e a seguran・ internacional. Essa pol・ica est?alinhada com uma promessa anterior do Departamento de Estado, de honrar crit・ios rigorosos ao licenciar exporta苺es de armas de pequeno porte. Al・ disso, as autoridades do governo dever・ promover o C・igo de Conduta Internacional outorgado pelo Congresso para assegurar que outros pa・es respeitem crit・ios rigorosos de exporta艫o. Os governos t・ a obriga艫o de assegurar que os armamentos n・ sejam utilizados para violar direitos e cometer abusos.

Em terceiro lugar, os Estados Unidos, bem como outras na苺es exportadoras, dever・ servir de exemplo ao adotar uma pol・ica de restri艫o ・ exporta苺es projetada para evitar desvios e ac・ulos perigosos de armamentos, com base na pol・ica norte-americana existente de "auditar e, se necess・io, suspender" as exporta苺es para um Estado, caso os pedidos de licen・ de exporta艫o de armas "excedam as necessidades dom・ticas normais e razo・eis de um dado pa・ importador ou exibam outras anormalidades". N・ dever・ ser introduzidas armas de pequeno porte em excesso em ・eas vulner・eis ou disponibilizadas para o mercado aberto. Os pa・es em desenvolvimento dever・ ser incentivados a despender seus escassos recursos no fortalecimento da sua infra-estrutura, e n・ na expans・ do seu poderio militar. Muito embora artigos de defesa excedentes sejam freq・ntemente fornecidos a custo reduzido, muitos pa・es seriam melhor servidos com apoio institucional.

Em quarto lugar, o Departamento de Estado dever?solicitar, e o Congresso dever?conceder, financiamento cont・uo e crescente para programas de destrui艫o de armas de pequeno porte e coopera艫o cont・ua sobre a destrui艫o de armamentos e gerenciamento de estoques, a fim de ajudar a destruir excessos de armas que, de outra forma, cairiam em regi・s de conflito. Est・ atualmente sendo desenvolvidos programas no leste europeu e a coopera艫o ?cont・ua com a Comunidade para o Desenvolvimento do Sul da ・rica. Atualmente, o Departamento de Estado recebe US$ 2 milh・s para esses programas. N・ ?suficiente. O Departamento de Estado dever?solicitar e receber fundos adicionais para esses programas e buscar expandi-los para outras regi・s. O recolhimento e a destrui艫o de armamentos excedentes facilita a reconstru艫o p・-conflito e reduz a probabilidade do retorno de um pa・ ?guerra. Ao final, os custos m・imos associados a esses programas s・ menores que os custos associados ao conflito e aos prolongados esfor・s de reconstru艫o p・-conflito que inevitavelmente se desenvolveriam a partir de ac・ulos excessivos e desestabilizantes de armas de pequeno porte.

Em quinto lugar, o Departamento de Estado dever?desenvolver um mecanismo de compartilhamento de informa苺es sobre os embargos de armas das Na苺es Unidas, seja nas Na苺es Unidas ou em f・uns regionais. Os Estados Unidos dever・ tamb・ aprimorar a implementa艫o e execu艫o da lei de com・cio de armas dos Estados Unidos (emenda de 1996 ?Lei de Controle das Exporta苺es de Armas) e incentivar outros pa・es a promulgar restri苺es similares. No passado, os Estados Unidos criticaram a falta de ades・ aos embargos de armas da ONU e recomendaram maior coopera艫o da comunidade internacional para executar seu cumprimento. O monitoramento e regulamenta艫o do com・cio de armas de pequeno porte e o processamento de violadores de leis nacionais e internacionais de controle de armas tornaria a implementa艫o de embargos de armas um desafio menor que o atual.

Em sexto lugar, o Departamento de Estado dever?defender a imediata ratifica艫o pelo Senado da conven艫o da Organiza艫o dos Estados Americanos sobre o tr・ico de armas de pequeno porte. Os Estados Unidos assinaram, em novembro de 1997, a Conven艫o Interamericana contra a Fabrica艫o Il・ita e o Tr・ico de Armas de Fogo, Muni苺es, Explosivos e Outros Materiais Similares, que se destina a aumentar os controles sobre as armas de pequeno porte e sua rastreabilidade, ?medida que se movem atrav・ de fronteiras. Como os Estados Unidos j?implementaram a maior parte das medidas estabelecidas na conven艫o, a ratifica艫o servir?de exemplo para o resto do hemisf・io. Um regime eficaz de controle do tr・ico il・ito de armas de pequeno porte poder?ser duplicado em outras regi・s e levar a controle internacional significativo desse com・cio ilegal.

Todas essas medidas levar・ a progressos sobre a quest・, mas o governo norte-americano n・ pode fazer sozinho o trabalho de combater a prolifera艫o e o mau uso das armas de pequeno porte. Os Estados Unidos necessitam, portanto, pressionar para a cria艫o de normas legalmente comprometedoras e a implementa艫o de medidas para evitar que os armamentos terminem nas m・s de for・s abusivas, sejam elas seus governos ou participantes n・-estatais. O objetivo geral deve ser o de elevar os padr・s internacionais sobre a exporta艫o e utiliza艫o de armas de pequeno porte e armamentos leves.

Trabalhando no sistema das Na苺es Unidas ou em outros f・uns internacionais apropriados, o governo dos Estados Unidos dever?iniciar negocia苺es sobre os tr・ instrumentos com for・ de lei a seguir:

  • Uma conven艫o estrutural sobre transfer・cias internacionais de armas que estabele・ crit・ios normativos de exporta艫o com base nas atuais obriga苺es dos Estados sob as leis internacionais.

  • Um acordo internacional sobre com・cio que crie leis e procedimentos internacionais que disciplinem as atividades dos negociantes de armas e fortale・ as leis nacionais, para processar os traficantes que violem essas normas.

  • Um acordo internacional sobre marca苺es e rastreamento que desenvolva sistemas para a marca艫o adequada e confi・el de armas na fabrica艫o e/ou importa艫o e manuten艫o de registros sobre a produ艫o, posse e transfer・cia de armas.

Os Estados Unidos tamb・ dever・ incentivar o estabelecimento de mecanismos de transpar・cia espec・icos para armas de pequeno porte e uma norma proibindo a posse por civis de armas de pequeno porte de estilo militar.

Enquanto aguardam que os governos adotem a苺es substanciais, as ONGs e os ativistas se organizaram. Muitos s・ participantes da Rede Internacional de A艫o sobre Armas de Pequeno Porte, uma rede de mais de 320 organiza苺es e indiv・uos em 70 pa・es. Como a quest・ das armas de pequeno porte ?muito diversificada, as ONGs representam ampla s・ie de interesses e possuem in・eras recomenda苺es pol・icas. Mas todas as ONGs concordam que a prolifera艫o de armas de pequeno porte necessita ser obstru・a e o mau uso dos armamentos, reduzido.

As ONGs que lutam por a苺es globais para combater a mar?de armas de pequeno porte compreendem que a a艫o ?um compromisso paulatino e de longo prazo. As atividades individuais e unilaterais n・ suavizar・ a totalidade do sofrimento humano causado pela prolifera艫o das armas de pequeno porte; isso exigir?compromissos internacionais abrangentes de longo prazo. Mas, a curto prazo, as a苺es e lideran・ dos Estados Unidos sobre a quest・ das armas de pequeno porte iniciar・ o processo de preven艫o dos danos causados por esses armamentos. As ONGs n・ est・ solicitando aos Estados Unidos ou a outros governos o banimento de uma classe inteira de armas, mas sim sua transfer・cia e utiliza艫o respons・el, assegurando que todos os participantes (indiv・uos, grupos armados e outros governos) fa・m o mesmo.

As a苺es imediatas e futuras dever・ incluir uma parceria entre os governos e as ONGs, trabalhando em conjunto para reduzir os danos das armas de pequeno porte. Ouvir amplos segmentos da sociedade civil e dar voz ・ v・imas de abusos de direitos humanos assegurar?uma pol・ica fundamentada e abrangente de armas de pequeno porte. Mas, ao final, s・ os governos que necessitam ser responsabilizados, para garantir que as armas de pequeno porte n・ continuem a ser utilizadas, nas palavras do secret・io geral das Na苺es Unidas, Kofi Annan, como "armas de destrui艫o em massa".

Cuidar da prolifera艫o e do mau uso das armas de pequeno porte n・ se refere ao controle global de armas, como reivindicam os cr・icos. Pol・icas sens・eis de armas de pequeno porte n・ se destinam a evitar a posse dom・tica de armas de fogo e rifles de ca・, como temem al guns grupos, mas a assegurar que as armas leves de alta pot・cia atuais n・ sejam utilizadas para fins de terrorismo ou para cometer crimes. Os Estados Unidos est・ dispostos a criar padr・s e normas internacionais para suspender a difus・ das armas de pequeno porte. Afinal, cuidar das armas de pequeno porte significa salvar vidas, por fim ao sofrimento humano e criar um futuro mais sustent・el e pac・ico.

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As opini・s expressas neste artigo s・ do autor e n・ refletem, necessariamente, as opini・s ou pol・icas do governo dos Estados Unidos.

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Ao come・ da p・ina | ・dice, | Agenda de Pol・ica Externa dos EUA, Junho 2001
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