O FMI E O BANCO MUNDIAL:
ATENDENDO A CRISES FINANCEIRAS E DESENVOLVIMENTO

Entrevista com Timothy Geithner, Membro S・ior do Conselho de Rela苺es Exteriores
e ex-Vice Secret・io do Tesouro para Assuntos Internacionais

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As institui苺es financeiras internacionais (IFIs) continuar・ a desempenhar papel crucial no sistema financeiro internacional, auxiliando os mercados de pa・es emergentes a atravessar crises financeiras e ajudando o desenvolvimento das na苺es mais pobres, afirma Timothy Geithner, ex-vice secret・io do Tesouro para Assuntos Internacionais. Reformas recentes, aumento dos financiamentos e novas ferramentas financeiras ajudaram a tornar as IFIs mais eficazes, afirma Geithner.

Esta entrevista foi conduzida pelo editor gerente de Perspectivas Econ・icas, Warner Rose.

Pergunta: A comunidade internacional e as institui苺es financeiras internacionais est・ mais aptas a evitar e conter crises financeiras hoje, em compara艫o com cinco anos atr・?

Geithner: Vivemos em um mundo de governos soberanos e de mercados de capitais cada vez mais integrados. O sistema como um todo sempre ter?capacidade limitada de evitar que governos soberanos tomem decis・s que mais tarde os levar・ a crises financeiras ou que n・ reduzam sua vulnerabilidade a crises.

A maior parte dos economistas concordaria que sua capacidade de prever crises eficientemente ?muito limitada. E, mesmo quando se pensa ter conhecimento confi・el dos riscos enfrentados por um pa・, ?dif・il convencer os governos a cuidarem desses riscos suficientemente cedo para tornar as crises menos prov・eis ou menos severas. Temos que come・r com esta premissa b・ica.

Como o mundo agora ?muito integrado e muitas economias de mercado grandes e emergentes que s・ significativas para o sistema est・ mais abertas aos fluxos de capital, o sistema como um todo ?mais vulner・el ・ mudan・s de percep艫o que s・ inerentes a todos os mercados. Em locais onde o capital ?mais vol・il, os efeitos de mudan・s de confian・, percep苺es e fundamentos podem ter efeito muito mais r・ido e de maior alcance sobre os pa・es.

Durante os ・timos cinco anos, houve diversos acontecimentos que forneceram ・ institui苺es financeiras internacionais ferramentas muito mais poderosas (principalmente ferramentas financeiras) para atender a crises e ajudar os pa・es a reduzirem sua vulnerabilidade.

O Fundo Monet・io Internacional (FMI) tamb・ incentiva os pa・es a moverem-se rumo a disposi苺es de taxas cambiais mais el・ticas, abandonando c・bios fixos que podem resultar no ac・ulo de d・ida externa de curto prazo e outras vulnerabilidades que podem ser t・ devastadoras em uma crise. Houve uma mudan・ rumo a um regime mais flex・el, que torna o pr・rio sistema mais el・tico. Mas provavelmente a mudan・ definitiva e mais promissora foi uma revolu艫o da transpar・cia; a qualidade das informa苺es que os pa・es que pertencem ao FMI necessitam revelar para os mercados ?muito maior, muito mais abrangente e muito mais oportuna do que nunca.

P: Quais s・ as novas ferramentas para atender ・ crises?

Geithner: As principais ferramentas s・ os maiores recursos do FMI.

Primeiramente, houve, em 1999, o aumento da quota de contribui艫o dos membros do FMI, que quase dobrou os recursos financeiros do Fundo. Em segundo lugar, um novo fundo de reserva financeira emergencial, denominado Novas Disposi苺es para Empr・timo, um fundo de US$ 50.000, que entrou em vigor em 1998. Foram estabelecidos novos instrumentos do FMI para fornecer a capacidade financeira em ampla escala em situa苺es de emerg・cia. Essa capacidade financeira ?fornecida a uma taxa de juros acima do mercado (uma taxa de juros de penaliza艫o) com vencimento menor, de forma que os pa・es n・ utilizar・ esse instrumento a menos que seja realmente necess・io e ser・ incentivados a voltar aos mercados privados o mais r・ido poss・el.

P: Quais s・ os instrumentos novos?

Geithner: O principal instrumento novo ?o Instrumento de Reserva Suplementar, o SRF. Um segundo ?a Linha de Cr・ito de Contingenciamento, ou CCL, que possui caracter・ticas levemente diferentes.

O SRF foi projetado para pa・es que passam por crises resultantes de uma mudan・ das condi苺es que geram grande movimenta艫o de fluxos de capitais. Geralmente, este instrumento dever?ser invocado somente quando houver algum risco de cont・io da crise.

O SRF foi utilizado pela primeira vez para a Cor・a em dezembro de 1997 e depois para o Brasil, em 1998.

A Linha de Cr・ito de Contingenciamento ?projetada para incentivar os pa・es a colocar em pr・ica antecipadamente pol・icas que possam torn?los menos vulner・eis a crises, fornecendo-lhes a capacidade de contingenciamento para retirar fundos potencialmente substanciais quando houver uma crise. Embora o CCL esteja pronto e ativo, ainda n・ foi utilizado.

P: Quais outras disposi苺es funcionam com essas ferramentas?

Geithner: Como complemento, os principais pa・es doadores/credores colocaram em pr・ica disposi苺es inovadoras com base no mercado para utiliza艫o durante crises, a fim de lidar com reivindica苺es apresentadas por investidores privados, de forma que a d・ida possa ser reestruturada quando necessitar de reestrutura艫o, ou que os credores externos de um pa・ possam ser incentivados a manter exposi苺es ou postergar o vencimento dessas exposi苺es quando apropriado.

Existe portanto agora, de forma geral, maior capacidade de uso das finan・s oficiais, o que ?mais uma resposta construtiva de investidores privados para ajudar a solucionar uma crise mais rapidamente.

P: Qual foi o efeito desses novos instrumentos?

Geithner: Eles deram ao FMI a capacidade de reagir com maior for・ financeira, quando necess・io, para lidar com uma crise que tenha ramifica苺es sist・icas e assegurar que isso seja feito em condi苺es capazes de restaurar rapidamente a confian・.

Foi esta capacidade que fez funcionar o programa para o M・ico em 1995 e possibilitou que as recupera苺es da Cor・a e do Brasil fossem t・ eficazes. Esses pa・es recuperaram-se muito mais rapidamente do que havia previsto a maioria das pessoas.

O mesmo tipo de pacotes financeiros inovadores foi utilizado para as crises que se seguiram, mais recentemente, na Argentina e na Turquia.

Nos casos em que houve sucesso, este deveu-se ?mescla praticamente sem precedentes de recursos financeiros em larga escala e um forte e confi・el programa de reformas econ・icas no pa・. Nos casos em que os programas n・ funcionaram, isso deveu-se em grande parte ao fracasso dos sistemas pol・icos dos pa・es em fazer esfor・s confi・eis para trazer a confian・ de volta.

P: E sobre a quest・ de danos morais: essas ferramentas de resgate, por existirem, encorajam investidores e pa・es a acreditarem que o FMI os salvar?de maus investimentos e pol・icas erradas?

Geithner: Os cr・icos argumentam que os programas de assist・cia para o M・ico, Cor・a e Brasil aumentaram o grau de danos morais ao sistema.

Mas, ao examinar os neg・ios financeiros dos mercados emergentes atualmente, o risco padr・ embutido nas taxas de juros agora conduzidas por esses empr・timos, a quantidade de dinheiro que agora flui para os mercados emergentes e a forma desses fluxos, existe pouco fundamento para concluir-se que um grau significativo e perigoso de danos morais foi induzido ao sistema. A maior parte dos bons trabalhos acad・icos recentes sobre este assunto chega a conclus・s similares. Existe maior diferencia艫o do que antes na forma como ?estabelecido o custo do risco de cr・ito nos mercados emergentes. Isto ?um bom indicador do sucesso das melhorias de transpar・cia e maior consci・cia dos riscos.

Sempre haver?danos morais ao sistema em virtude da exist・cia do FMI e este risco necessariamente aumenta ao fazer-se o que foi feito nos ・timos anos, expandindo-se os recursos dispon・eis para crises e anunciando que estamos preparados para fazer uso deles. O desafio ?limitar este risco, preservando a capacidade de reagir de forma eficiente a crises futuras.

P: O FMI est?se envolvendo mais em programas de desenvolvimento?

Geithner: A an・ise do que proporciona desenvolvimento vitorioso dur・el expandiu-se ao longo do tempo. Reconhece-se atualmente que o crescimento exige mais do que pol・icas macroecon・icas confi・eis. Uma grande quantidade depende da qualidade da estrutura institucional estabelecida para permitir que uma economia de mercado funcione. E uma grande parte do que importa ?a escala e a qualidade dos investimentos feitos em assist・cia m・ica, educa艫o e similares.

O Fundo deveria concentrar-se principalmente na estrutura pol・ica macroecon・ica, que ?fundamental para estrat・ias dur・eis de crescimento. Mas existem assuntos fora desta estreita estrutura que tamb・ s・ importantes para a estabilidade financeira, como a for・ do pr・rio sistema financeiro. Estas quest・s s・ a ocupa艫o do Fundo. As quest・s mais amplas de mudan・s estruturais e programas sociais dever・ ser ocupa艫o dos bancos multilaterais de desenvolvimento.

P: Como o FMI e o Banco Mundial trabalhar・ juntos? Onde termina a tarefa de um e come・ a do outro?

Geithner: Na maioria dos pa・es, o Banco e o Fundo provavelmente trabalhar・ lado a lado por um per・do de tempo significativo. Este provavelmente n・ ser?o caso nas economias dos mercados emergentes; nelas, ser?mais casual, com o Fundo envolvido temporariamente. Mas, nas economias em transi艫o, nos pa・es mais pobres, ambos provavelmente estar・ lado a lado, trabalhando juntos, por um longo per・do de tempo.

O Fundo far?a macroestrutura b・ica, que inclui a pol・ica de taxas de c・bio, que ajuda a determinar o crescimento de um pa・ e se o dinheiro fica ou n・ no pa・. E o Banco far?os investimentos a longo prazo em pol・ica de desenvolvimento para aprimorar a qualidade dos servi・s p・licos, tais como assist・cia m・ica, educa艫o e desenvolvimento agr・ola.

No setor financeiro, o Fundo e o Banco trabalham juntos de forma eficiente, particularmente ao projetarem um programa para fortalecer o sistema financeiro de um pa・.

P: Onde se encaixam os bancos regionais de desenvolvimento na divis・ de trabalho?

Geithner: O Banco Mundial e os bancos regionais de desenvolvimento necessitam selecionar, regi・ por regi・, pa・ por pa・, o que o Banco dever?fazer e o que dever・ fazer os bancos de desenvolvimento. Todos t・ interesse em criar uma divis・ pr・ica de trabalho, pois os recursos s・ escassos e eles n・ querem todos estar tentando fazer o mesmo tipo de coisa. Os bancos de desenvolvimento afirmam estar cientes da necessidade de serem complementares, e n・ redundantes.

P: Os bancos de desenvolvimento deveriam estar emprestando para pa・es em desenvolvimento que j?podem tomar emprestado nos mercados financeiros internacionais?

Geithner: O acesso dos pa・es em desenvolvimento ao mercado ?t・ue, fr・il, vulner・el ?revers・, parcial e de alto custo. Isto ?verdadeiro da Pol・ia ?Indon・ia, do Brasil ?Cor・a, e a maior parte dos pa・es mais pobres n・ tem acesso ao mercado.

Mesmo os pa・es que se estabeleceram nos mercados privados ・ vezes t・ o acesso rompido, abreviado, limitado ou dispon・el a custos muito altos, com vencimentos muito curtos. Acho que a experi・cia dos ・timos cinco anos deveria demonstrar que a situa艫o b・ica dos bancos de desenvolvimento descrita na confer・cia de Bretton Woods em 1944 ?melhor hoje do que naquela ・oca, pois o mundo ?mais integrado, apesar do fato dos mercados de capital privado serem agora t・ grandes.

P: Qual ?a pr・ima etapa da iniciativa de perd・ de d・ida Pa・es Pobres Altamente Endividados (HIPC), administrada pelo FMI e pelo Banco Mundial?

Geithner: Embora 22 pa・es tenham come・do a beneficiar-se da iniciativa de perd・ de d・ida, ela ainda se encontra no seu est・io inicial. Os principais objetivos da iniciativa s・ o de colocar em pr・ica mudan・s duradouras da forma como o FMI e o Banco Mundial estabelecem prioridades de desenvolvimento e definem a condicionalidade pol・ica, e de mudar a forma como os governos benefici・ios tomam decis・s sobre como utilizar seus recursos. ?necess・io que haja redirecionamento das prioridades da pol・ica econ・ica nesses pa・es, novos mecanismos de presta艫o de contas, aumento da participa艫o da sociedade civil e redirecionamento dos recursos do perd・ da d・ida para investimentos em prioridades fundamentais de desenvolvimento.

Examinando adiante, os pa・es doadores, incluindo os Estados Unidos, necessitam ser muito cuidadosos sobre seus empr・timos aos benefici・ios do HIPC. Todos os principais governos doadores possuem programas de empr・timos bilaterais que ap・am exporta苺es, incluindo exporta苺es agr・olas e similares. ?muito importante que essas ag・cias bilaterais n・ coloquem dinheiro nesses pa・es sob taxas de mercado, de forma a aumentar seus encargos da d・ida.

Os Estados Unidos incentivam outros pa・es doadores a comprometerem-se a fornecer a maior parte da sua assist・cia ao desenvolvimento na forma de doa苺es. ?algo que os Estados Unidos fizeram muito tempo atr・. H?tamb・ um movimento para oferecer mais assist・cia do Banco Mundial para os pa・es mais pobres, oferecida na forma de doa苺es, particularmente para as na苺es altamente endividadas.

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Observa艫o: as opini・s expressas nesta entrevista n・ refletem, necessariamente, as opini・s ou pol・icas do governo dos Estados Unidos.

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Ao come・ da p・ina | Indice, Perspectivas Econ・icas, Fevereiro de 2001
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