A Evolução da Liberdade Religiosa como Direito Humano Universal

Derek H. Davis

Thin blue rule

Nos anos ap¡¦ a Segunda Guerra Mundial, especificamente, a id¡¦a de liberdade religiosa evoluiu at¡¦um direito humano internacional que todas as nações do mundo s¡¦ obrigadas a proteger. No artigo a seguir, Derek Davis, diretor de Estudos entre Igreja e Estado da Universidade de Baylor no Texas e especialista em religi¡¦ enquanto liberdade fundamental, discute os quatro pilares da liberdade religiosa internacional e como as obrigações dos tratados internacionais poder¡¦ ser mais plenamente implementadas.

O s¡¦ulo XX presenciou progressos sem precedentes rumo ¡¦internacionalização dos direitos humanos religiosos. Realizou-se o Parlamento Mundial das Religi¡¦s em Chicago em 1893, como parte da Exposição de Col¡¦bia, evento esquecido h¡¦muito tempo mas importante na hist¡¦ia religiosa do mundo. Um princ¡¦io fundador da reuni¡¦ foi que nenhum grupo religioso dever¡¦ser pressionado at¡¦sacrificar suas reivindicações de verdade. Em 1944, o Conselho Federal de Igrejas dos Estados Unidos criou a Comiss¡¦ de Estudo das Bases de uma Paz Justa e Duradoura. A Comiss¡¦ desenvolveu os "Seis Pilares da Paz", que mesclaram medidas t¡¦icas, tais como a "reforma dos tratados globais" e o "controle de estabelecimentos militares", com princ¡¦ios tais como a "autonomia para crentes" e o "direito dos indiv¡¦uos de todas as partes ¡¦liberdade religiosa e intelectual". Outro grupo, a Comiss¡¦ Norte-Americana das Igrejas sobre Quest¡¦s Internacionais (CCIA), ajudou a promover a inclus¡¦ da liberdade religiosa na Declaração Universal de Direitos Humanos, adotada pelas Nações Unidas em 1948.

Al¡¦ da Declaração Universal, tr¡¦ outros documentos internacionais significativos foram desenvolvidos no s¡¦ulo XX com o prop¡¦ito de promover princ¡¦ios de liberdade religiosa: a Convenção Internacional sobre Direitos Civis e Pol¡¦icos (1966); a Declaração das Nações Unidas sobre a Eliminação de Todas as Formas de Intoler¡¦cia e Discriminação com base na Religi¡¦ ou Cren¡¦ (1981); e o Documento Final de Viena (1989). Cada um desses documentos promove a liberdade religiosa ao expor os direitos de tal significado que dever¡¦ ser universais. Cada um desses documentos ¡¦descrito abaixo.

Os Quatro Pilares da Liberdade Religiosa Internacional

Dos quatro principais documentos internacionais que universalizaram o princ¡¦io da liberdade religiosa no s¡¦ulo XX, o mais importante ¡¦ de longe, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada pelas Nações Unidas em 1948. Esse documento hist¡¦ico reconhece diversos direitos religiosos importantes. O Artigo 18 ¡¦o texto principal:

Toda pessoa tem direito ¡¦liberdade de pensamento, de consci¡¦cia e de religi¡¦; este direito implica a liberdade de mudar de religi¡¦ ou de convicção, assim como a liberdade de manifestar a religi¡¦ ou convicção, sozinho ou em comum, tanto em p¡¦lico como em privado, pelo ensino, pela pr¡¦ica, pelo culto e pelos ritos.

A Declaração determina vigorosamente que as diferen¡¦s religiosas individuais devem ser respeitadas. Ela abra¡¦ o princ¡¦io pol¡¦ico de que um papel fundamental do governo ¡¦o de proteger a escolha religiosa, e n¡¦ ditar a conformidade religiosa. Levou s¡¦ulos, at¡¦mil¡¦ios, de guerras religiosas e perseguição religiosa para que a maior parte das nações-Estados modernas chegasse a essa posição, mas o princ¡¦io ¡¦agora amplamente aceito, especialmente no Ocidente. O princ¡¦io moderno de liberdade religiosa, atrav¡¦ do qual os governos declaram sua neutralidade sobre quest¡¦s religiosas, permitindo a cada cidad¡¦ individual, com base na sua pr¡¦ria dignidade humana, adotar suas cren¡¦s religiosas sem medo de repres¡¦ia, ¡¦conseqüência natural do esclarecimento. Ele recebeu reconhecimento universal na Declaração de 1948, sem d¡¦ida o maior marco da evolução da liberdade religiosa internacional.

A Declaração refere-se a um "padr¡¦ comum de realização para todos os povos e nações". Escrita logo ap¡¦ os horrores indescrit¡¦eis da Segunda Guerra Mundial, ela fornece um padr¡¦ atrav¡¦ do qual os povos do mundo podem aprender a viver em paz e cooperação. Caso o mundo goze de maior paz no atual mil¡¦io que nos anteriores, ¡¦poss¡¦el que os historiadores do futuro olhem para 1948 como o in¡¦io da nova era de paz, da mesma forma que olhamos agora, por exemplo, para o Edital de Mil¡¦ de 313 como o in¡¦io da uni¡¦ constantiniana entre Igreja e Estado, ou 1517 (apresentação das 95 Teses de Martinho Lutero) como o in¡¦io da Reforma Protestante. Simplesmente n¡¦ h¡¦forma de exagerar o significado da Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Embora a Declaração tenha imposto obrigações morais a todas as nações signat¡¦ias, documentos posteriores a ampliaram ao criarem obrigações legais de cumprimento dos seus princ¡¦ios amplos. A Convenção Internacional sobre Direitos Civis e Pol¡¦icos (1966), ratificada at¡¦o momento por 144 nações, pro¡¦e a discriminação religiosa, conforme determinado no Artigo 2(1), "sem distinção de nenhum tipo, tal como ra¡¦, cor, sexo, idioma, pol¡¦ica ou de opini¡¦ diferente, origem nacional ou social, propriedade, nascimento ou outra situação". O Artigo 18 garante os mesmos direitos relacionados no Artigo 18 da Declaração Universal e agrega mais, incluindo o direito dos pais dirigirem a educação religiosa dos seus filhos. O Artigo 20 pro¡¦e o est¡¦ulo do ¡¦io contra os demais devido ¡¦sua religi¡¦ e o Artigo 27 protege os membros de minorias ¡¦nicas, religiosas ou lingüísticas para que n¡¦ lhes seja proibido usufruir da sua pr¡¦ria cultura. Al¡¦ disso, a Convenção de 1966 fornece definição ampla de religi¡¦ que engloba religi¡¦s te¡¦tas e n¡¦ te¡¦tas, bem como "credos raros e virtualmente desconhecidos".

A Declaração das Nações Unidas sobre a Eliminação de Todas as Formas de Intoler¡¦cia e de Discriminação com base na Religi¡¦ ou Cren¡¦, adotada em 1981, ¡¦outro documento fundamental que protege os direitos religiosos. Os Artigos 1 a 6 proporcionam relação abrangente de direitos relativos ¡¦liberdade de pensamento, consci¡¦cia e religi¡¦. Estes incluem o direito de (1) culto ou reuni¡¦ relativa a uma religi¡¦ ou cren¡¦ e estabelecimento e manutenção de lugares com esses prop¡¦itos; (2) estabelecer e manter instituições humanit¡¦ias ou beneficentes apropriadas; (3) fazer, adquirir e utilizar at¡¦um ponto adequado os artigos e materiais necess¡¦ios e relativos aos rituais ou costumes de uma religi¡¦ ou cren¡¦; (4) escrever, publicar e disseminar publicações relevantes nessas ¡¦eas; (5) ensinar religi¡¦ ou cren¡¦ em locais apropriados para esses fins; (6) solicitar e receber contribuições financeiras volunt¡¦ias e outras de indiv¡¦uos e instituições; (7) observar dias de repouso e celebrar dias sagrados e cerim¡¦ias de acordo com os preceitos de uma religi¡¦ ou cren¡¦; e (8) estabelecer e manter comunicações com indiv¡¦uos e comunidades em quest¡¦s de religi¡¦ e cren¡¦ em n¡¦el nacional e internacional.

Por fim, o Documento Final de Viena de 1989 cont¡¦ disposições similares aos documentos de 1948, 1966 e 1981, exigindo respeito pelas diferen¡¦s religiosas, especialmente entre diversas comunidades de f¡¦ As nações participantes concordam especificamente em assegurar "a implementação total e efetiva de pensamento, consci¡¦cia, religi¡¦ ou cren¡¦".

Esses documentos internacionais est¡¦, na verdade, comprometendo apenas as nações que tomem medidas para dar-lhes situação legal. Em outras palavras, elas n¡¦ s¡¦ auto-execut¡¦eis. Embora as proteções ¡¦liberdade religiosa contidas nos documentos internacionais n¡¦ possuam efeito de lei, elas j¡¦est¡¦ moldando a legislação de direitos humanos nas nações participantes e s¡¦ caracter¡¦tica fundamental de uma ordem mundial em desenvolvimento e, esperamos, mais pac¡¦ica. Entretanto, no mundo de hoje, a religi¡¦ ainda ¡¦fonte de grande conflito e princ¡¦ios fundamentais de liberdade religiosa s¡¦ muitas vezes mais insultados que respeitados. Pode-se fazer mais para aumentar a liberdade religiosa?

Transformação das Obrigações Internacionais em Realidade

A perseguição religiosa continua a ser um problema s¡¦io, apesar das medidas significativas tomadas pela comunidade mundial para combat¡¦la, particularmente desde a Segunda Guerra Mundial, sinal moderado de que as declarações, convenções e outros documentos n¡¦ se traduzem facilmente em realidade. Acad¡¦icos destacaram pelo menos quatro ¡¦eas nas quais as abordagens institucionais podem ser eficazes no aux¡¦io para tornar a liberdade religiosa n¡¦ apenas um ideal mundial, mas tamb¡¦ uma realidade mundial.

Implementação de tratados. As nações devem levar a s¡¦io as disposições de tratados de direitos humanos internacionais, integrando-os em seus pr¡¦rios sistemas legais. ¡¦talvez repetitivo afirmar que a liberdade religiosa no mundo seria uma d¡¦iva se todos os pa¡¦es do mundo cumprissem com as diversas Convenções e outros documentos que v¡¦ sendo adotados desde a Segunda Guerra Mundial. Isso n¡¦ reflete o fato de que muitos governos se d¡¦ ao luxo de dormir sobre os louros dos ideais que assinaram, enquanto deixam de adotar as ações legais e outras necess¡¦ias para torn¡¦las realidade.

Legislação. Os governos em todo o mundo dever¡¦ promulgar legislação significativa projetada para conter a perseguição religiosa. Em 1998, o Congresso norte-americano aprovou a Lei da Liberdade Religiosa Internacional. Essa Lei exige um relat¡¦io anual preparado pelo Departamento de Estado que determina e descreve as violações de liberdade religiosa em cada pa¡¦. O Departamento tamb¡¦ considera as sugest¡¦s de uma Comiss¡¦ Norte-Americana sobre Liberdade Religiosa Internacional, de nove membros. Com base no relat¡¦io anual, o presidente dos Estados Unidos pode impor uma s¡¦ie de penalidades e sanções a pa¡¦es considerados violadores. A legislação ¡¦controversa internacionalmente, mas a medida at¡¦agora ajudou a causa da liberdade religiosa internacional. A lei n¡¦ tenta impor o "modo norte-americano" a outras nações. Ao contr¡¦io, ela conta com a cren¡¦ aceita universalmente na dignidade inviol¡¦el de todos os seres humanos e nos direitos universais que surgem dessa cren¡¦. Educação. Mais necessita ser feito para conscientizar os povos do mundo sobre o n¡¦el impressionante de perseguição religiosa que ainda prevalece em muitas partes do mundo. Mais confer¡¦cias e simp¡¦ios poder¡¦ destacar este tema e mais apoio (verbal e monet¡¦io) poder¡¦ser fornecido a organizações n¡¦-governamentais de direitos humanos, tais como a Human Rights Watch e a Associação para a Liberdade Religiosa Internacional, que acompanham abusos de direitos humanos em todo o mundo e os relata a governos e outros grupos interessados.

Separação entre Igreja e Estado. Deve haver esfor¡¦s renovados para aumentar o respeito por todas as instituições pol¡¦icas, religiosas e sociais para a vis¡¦ moderna de que os principais interesses da sociedade pol¡¦ica est¡¦ no incentivo ¡¦paz, justi¡¦, igualdade e liberdade, n¡¦ em fazer avan¡¦r a religi¡¦. Este ¡¦o significado b¡¦ico da separação entre Igreja e Estado. A tens¡¦ ¡¦via aqui ¡¦que, historicamente, a religi¡¦ vem sendo a base de todas as dimens¡¦s da vida, incluindo as pol¡¦icas. Como observou o eminente quacre William Penn em 1692, "o governo parece ser uma parte da pr¡¦ria religi¡¦, algo de sagrado na sua instituição e prop¡¦ito". Naturalmente, Penn era um not¡¦el separacionista entre Igreja e Estado e moveu-se cada vez mais para a vis¡¦ de que a religi¡¦ ¡¦fundamentalmente uma preocupação pessoal e individual, e que o papel do governo dever¡¦ser a proteção de todas as vis¡¦s religiosas em vez da defesa de uma. Desde os dias de Penn, os Estados-nações v¡¦ adotando cada vez mais essa perspectiva e os documentos de direitos humanos do s¡¦ulo XX fizeram o mesmo. Conforme j¡¦sugerido, essa perspectiva necessita ser ensinada por instituições educacionais, atrav¡¦ de uma s¡¦ie de curr¡¦ulos que confrontem a interação entre religi¡¦ e governo no mundo moderno. Na an¡¦ise final, n¡¦, como membros da comunidade mundial, devemos a n¡¦ e aos nossos descendentes tornar a liberdade religiosa uma liberdade para todos. N¡¦ h¡¦tarefa mais importante neste in¡¦io do s¡¦ulo XXI.

Thin blue rule

Ao come¡¦ da p¡¦ina | Questoes de Democracia, Novembro de 2001
IIP revistas electr¡¦icas | IIP Home